10 livros para não temer a morte

A morte sempre foi a mais temida das nossas companheiras. Desde que o mundo é mundo, aliás, desde quando passamos a habitá-lo, o medo da morte, esse grande mistério da vida, sempre nos perturbou. Não podemos afirmar, é certo, se essa preocupação abateu-se de igual modo ao homem em estado de natureza idealizado por Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), mas é certo que, segundo Arthur Schopenhauer (1788–1860) “No homem, o surgimento da razão trouxe necessariamente consigo a assustadora certeza da morte”. Isso porque segundo ele, o indivíduo animal vive sem total conhecimento dela, desfrutando diretamente de toda a imortalidade da espécie, tem apenas consciência de si como ser sem fim.

Com a razão, tomamos conhecimento da nossa finitude. É ela também quem nos colocou no caminho de criar as respostas metafísicas e religiosas, como afirma Schopenhauer, e por que não a literatura, como remédio, ou substituto a essa certeza de morrer.

Ao longo da história do pensamento, grandes foram os nomes que se debruçaram sobre a questão da morte. Para ficarmos com apenas dois exemplos, é conhecido e belo o diálogo Fédon de Platão (428-427 a.C. – 348-347 a.C.), que narra Sócrates em seu leito de morte ensinando aos seus seguidores a não chorarem por sua partida porque ele mesmo não a teme, ao tempo em que prova a imortalidade da alma; e Sêneca (4 a.C.? – 65 d.C.) que em vários tratados Sobre a brevidade da vida, ou Tranquilidade da alma discorreu sobre o tema, ensinando-nos, como o fez a Lucílio em muitas de suas cartas, que “é um erro imaginar que a morte está à nossa frente: grande parte dela já pertence ao passado, toda nossa vida pretérita é já do domínio da morte!”.

O tema da morte também habitou a mente de grandes e diversos escritores que a trataram de forma jocosa, ou advogaram em favor do suicídio – que talvez fosse a única ocasião de termos a vida em nossas mãos; ou a narraram como algo certo e sabido por todos e o que interessou foi o estado de espírito das personagens diante dela.

Desse modo, listamos para vocês dez livros cujo tema é ela a quem não devemos temer.

A morte de Ivan Ilitch, Leon Tolstoi
Ivan Ilitch foi um burocrata de carreira que sempre se esforçou para progredir e manter um status social mais condigno com sua pessoa. É um homem vaidoso e orgulhoso de sua elegante casa, decorada com refino e a altura de sua personalidade. É durante a decoração dessa casa que Ivan sofre um pequeno acidente que, por ora, passou despercebido, mas que, ao longo da novela, irá ceifar sua vida e a dignidade de um homem, tão orgulhosamente construída. A angústia sofrida pelas dores da doença e pela indiferença familiar foram captadas por Tolstoi numa brilhante reflexão sobre a vida.

Noturno do Chile, Roberto Bolaño
É também enquanto espera pela morte que Sebastián Urrutia Lacroix, padre e crítico literário, depara-se com questões não resolvidas durante a vida e que, ao longo dessa narrativa febril, repassará a vida e suas experiências literária num único parágrafo, que nos exigirá fôlego.

A cerimônia do adeus, Simone de Beauvoir
As memórias de Beauvoir sobre os últimos anos de vida de Sartre são os testemunhos de uma das histórias de amor, amizade e companheirismo das mais bonitas da história da filosofia.

Crônicas de uma morte anunciada, Gabriel Garcia Marquez
Aqui o Gabo reconstrói o itinerário da morte de Santiago Nasar a partir do relato de todos aqueles que estiveram com a personagem em seu último dia de vida e que sabiam que este estava jurado de morte. A narrativa é simples, mas a certeza da morte é chocante para aqueles que dela sabiam e não puderam evitá-la.

O céu dos suicidas, Ricardo Lísias
Se em Crônica de uma morte anunciada é o sobrinho de Santiago Nasar quem remonta o quebra-cabeça sobre as circunstâncias da morte do tio, aqui é o próprio autor, Ricardo Lísias, quem investiga o porquê do suicido do amigo, nos tempos da faculdade. A narrativa é certeira e ágil, envolve memória e ficção e nos perturba com a questão do suicídio e de sua causa.

Suicídios exemplares, Enrique Vila-Matas
Nesse livro de contos, o escritor catalão sabe colocar como ninguém a questão do suicídio, seja banalizando-o ou naturalizando com humor sutil a sua possibilidade. Mas o mais instigante é o insucesso das suas personagens no intento de se matarem.

As intermitências da morte, José Saramago
“No dia seguinte ninguém morreu.” Já imaginaram se esse dia de fato chegasse? Saramago imaginou e mostrou-nos o insuportável que seria a vida se ninguém morresse. O capitalismo e a religião sucumbiriam, poderíamos com isso nos alegrar, mas há os “mortos-vivos” a se acumularem nos hospitais, sem leitos, nas casas, sem poderem ser enterrados, o que nos faria, paradoxalmente, desejar voltar a morrer.

Pulp, Charles Bukowski
E ninguém desejou mais a morte do que Nick Belane, aliás, desejou a Dona Morte de salto alto e vestido bem justo vermelho, curvas voluptuosas e, segundo Belane: muito gostosa! Esse último livro de Bukowski é uma trama que envolve seres misteriosos, um pássaro vermelho e muita reflexão sobre a vida e o seu sentido.

Contos de enganar a morte, Ricardo Azevedo
O título já diz. São várias narrativas infanto-juvenis em que as personagens se deparam com a morte e, em todas as ocasiões, num primeiro momento, a morte se mostra de forma bondosa; por ter sido bem tratada, faz um trato com as personagens de cada conto; estas realizam inúmeros pedidos e levam uma vida feliz, com prosperidade, até que um dia aquela que nunca falha, mas nunca mesmo, aparece para cumprir sua missão.

Contos de morte morrida, Ernani Ssó
Também do universo infanto-juvenil, essas narrativas folclóricas trazem personagens tentando enganar a morte e esticar um pouquinho mais a vida; eles descobrem que o preço a se pagar por tentar ludibriar a morte é alto e custa o mesmo tanto que a própria vida.

E, por fim, “Medita diariamente nisto, para seres capaz de abandonar a vida com serenidade de espírito: muitos são os que se agarram a ela como pessoas arrastadas pela corrente, que jogam a mão aos cardos e aos rochedos! Muitos há que andam miseravelmente à deriva entre o medo da morte e os tormentos da vida, sem querer viver nem saber morrer.” É o que aconselha Sêneca a Lucílio, ou a todos nós.

Fonte: Homo Literatus

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